“Os protocolos dos sábios de Sião” foi um documento forjado
que estimulou a teoria da conspiração mais popular da História: o mito da
dominação judaica. Essa falsificação foi utilizada por Hitler e pelo nazismo
para justificar o extermínio dos judeus na Segunda Guerra Mundial.
Palavras-chave: antissemitismo, nazista, Israel
Estamos em Praga, por volta da metade do século XIX, entre
as sepulturas amontoadas do velho cemitério judeu. A meia-noite logo vai soar,
o silêncio se torna mais pesado sobre a cidade, a escuridão se faz mais
espessa. As portas do cemitério foram entreabertas; sombras deslizam furtivamente,
envoltas em longos mantos, depois se reagrupam em torno de uma pedra tumular.
Trata-se dos representantes das doze tribos de Israel que, segundo uma tradição
secreta, devem todos os séculos, entrar em acordo sobre os procedimentos que
devem tomar para garantir o sucesso do plano milenar de dominação do mundo.
E então, segundo essa história, um desses sábios afirma mais ou menos assim: já que o povo de Israel
foi pisoteado, humilhado, perseguido e teve que se dispersar pelo cinco
continentes, eles deveriam dominar todo o planeta. A Terra inteira pertenceria aos
judeus.
Nesse vídeo a gente vai ver como essa narrativa fictícia se
desenvolveu no imaginário ocidental até se transformar no mito da grande
conspiração judaica, que acabou legitimando violências da magnitude do holocausto.
Segundo Raoul Girardet, o mito da conspiração judaica tem
origem em um capítulo de um livro de ficção medíocre, publicado em Berlim em 1868,
com o título de Biarritz. O livro era assinado sob o pseudônimo de Sir John Retcliffe.
E o escritor, na verdade, era um
funcionário demitido do serviço dos Correios da Prússia, chamado Hermann
Goedsche. Antissemita, é claro.
Depois de ter sido publicado pela Europa oriental, esse
trecho em particular, isolado do seu contexto da obra de ficção, acabou
chegando ao público francês pela imprensa.
Só que os jornais afirmavam que a história era verdadeira e baseada em um testemunho autêntico de um diplomata britânico
chamado Sir John Readclif – assim mesmo, com a grafia ligeiramente diferente do
pseudônimo do romancista.
E além disso, em vez de vários personagens que no romance
original se alternavam no discurso, nessa
nova versão a conspiração judaica era revelada por um único rabino.
Não demorou para que a versão do jornal começasse a ser
amplamente citada. Em 1896 um livro de François Bournaud, chamado “Os judeus,
nossos contemporâneos”, reproduziu essa ideia do “discurso do rabino” e alcançou
repercussão internacional.
E já em 1933, a introdução da edição sueca desse livro garantiu
que o diplomata que havia revelado a conspiração judaica havia sido misteriosamente assassinado.
Não se esqueça: o diplomata nunca existiu. Era o pseudônimo
do funcionário dos correios, que era o verdadeiro autor do livro de ficção.
O fato é que essa história de um plano metódico, rigorosamente
articulado para a dominação do mundo pelos judeus correu o planeta.
Dezoito séculos pertenceram a nossos inimigos, proclama o
rabino na noite do cemitério de Praga; o século atual e os séculos futuros
devem pertencer a nós, povo de Israel, e certamente nos pertencerão.”
Segundo esse plano, os judeus, pouco a pouco, dominariam a
economia, a política e se enraizariam em todas as esferas da sociedade. Para
isso usariam da especulação financeira e da influência nos governos, ao
controle das escolas e dos meios de comunicação do mundo inteiro.
O complô judeu, assim como o complô jesuítico e complô
maçônico, foram mitos políticos muito presentes no imaginário do século XIX e
do século XX.
Aquele “discurso do rabino”, em particular, foi a
matéria-prima de um documento primordial da história ideológica contemporânea: Os
protocolos dos sábios de Sião.
Os protocolos foram uma falsificação do final do século XIX,
produzido pela polícia russa, antes da revolução comunista, ainda no período
czarista, e que circulou em vários países antes da Primeira Guerra Mundial.
Para se ter ideia do impacto histórico desse mito, esse texto forjado era
citado recorrentemente por Hitler para
justificar o extermínio dos judeus.
Desde o século XIX, os folhetins e esses romances populares,
direcionados a um público apaixonado por sensacionalismo, forneceram um
repertório fabuloso de temas e imagens que instigaram a imaginação política das
pessoas.
Mas apesar da criatividade e da diversidade de histórias, ao
analisar essas narrativas, não é difícil perceber um mesmo conjunto mitológico
na sua estrutura.
Todos os mitos da conspiração, por exemplo, começam com a
imagem daquela entidade secreta que deve ser vista com temor e de desconfiança:
a “Organização”.
A fabulação em torno desses mitos políticos segue um roteiro
que já é clássico. A organização é descrita como uma entidade repleta de segredos,
indevassável e por isso é difícil entender o que “eles” estão maquinando e é
quase impossível denunciá-los.
Investigá-los já é perigoso.
Para ingressar na organização é preciso passar por cerimônias
e rituais em lugares secretos, clandestinos. Os membros se se comunicam por senhas,
códigos e por sinais que só eles entendem. E os cúmplices estão ligados por juramentos
e pactos de silêncio.
Para cumprir seus objetivos, todos os meios são legítimos.
Da delação à traição, da espionagem ao assassinato misterioso – envenenamento, desaparecimentos,
acidentes...
Na fabulação dessas mitologias, o objetivo final de todas as
artimanhas da conspiração não é nada menos do que a instauração do império das
trevas em todo o planeta. A gente costuma se achar muito racional, mas nossos
juízos políticos estão carregados de mitologias e de religiosidade.
Mas a gente vai ver isso no próximo vídeo.
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